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Museu do Açúcar e Doce (MAD)

O mingau de milho e a reza de Santo Antônio

Nas muitas tradições religiosas populares, há sempre um complemento na culminância desses rituais como, por exemplo, o oferecimento de comidas e/ou bebidas. E cada cardápio vai simbolizar o tipo de celebração, também destacar ingredientes que podem mostrar as possibilidades do meio ambiente, e marcar o terroir.

E as festas dos santos de junho, Antônio, João e Pedro, mostram o milho enquanto ingrediente de maior significado que apenas o nutricional, quando ele será consumido em diferentes preparos, e marcará simbolicamente um dos principais papéis da comida que é o de lugar de pertencimento.

Pode-se dizer, ainda, que comer e beber nesses ambientes de festa e religiosidade revela e aproxima a pessoa do que é sagrado, do que é votivo, pois as alimentações coletivas reforçam os mais profundos laços com um sentimento que podemos entender por identidade.

Trago como exemplo a grande fé popular por Santo Antônio, santo português que acompanhou todo o processo histórico da colonização, e que mostra uma grande presença em todo o Brasil, seja por meio da música, da dança, dos cortejos, das trezenas, dos tríduos; e especialmente das comidas de milho.

Na Bahia, notadamente no Recôncavo, são comuns as rezas de Santo Antônio nas casas, nas igrejas e nos terreiros de candomblé, pois os muitos e diferentes processos do chamado sincretismo religioso afirma uma profunda relação sagrada entre Santo Antônio e o orixá Ogum.
Nessa devoção, há uma proximidade, uma intimidade entre Santo Antônio e o devoto, numa relação de amizade e de profundo afeto, faz-se assim uma fé ampliada.

Ainda no contexto do Recôncavo baiano, é comum servir, após as Rezas, um mugunzá feito com milho branco, e, em especial, um mingau no melhor estilo baiano, mingau quase líquido para ser bebido, sendo um mingau de milho amarelo. E assim se expressa a devoção, porque comer a comida da festa é um importante momento de viver a religiosidade.

 

RAUL LODY

Doce culto a Santo Antônio - Museu do Açúcar e Doce

O doce culto a Santo Antônio

Com festa, fé e comida, as celebrações de um dos santos mais populares, Santo Antônio, são vividas. Destaque, para as trezenas de Santo Antônio que antecedem os grandes rituais em 13 de junho.

Depois das cerimônias das trezenas nas igrejas e nos conventos; e, em especial, nas casas, como mais um momento de sociabilidade, onde são oferecidas comidas e bebidas, geralmente comidas doces. Entre estas comidas doces que marcam a tradição em louvar a Santo Antônio estão: mugunzá, bolos, biscoitos, canjica, pamonha. E nestes cenários destaco o arroz doce, uma comida doce tão integrada aos nossos sistemas alimentares.

Manjerico ou manjericão: um novo doce de Santo Antônio

Em Portugal, as festas populares de junho trazem rituais pré-cristãos que estão integrados ao solstício de verão no Hemisfério Norte. Assim, recuperam-se as memórias remotas ibéricas que apontam para os rituais da fertilidade com água e ervas, quase sempre ervas aromáticas, como é o caso do manjerico ou manjericão.

As devoções são marcadas pelos atos individuais nas casas, nas igrejas, nas procissões, nas comidas e nas bebidas, que fazem parte das sociabilidades dos festejos e da fé aos santos populares.

Entre os alimentos destes rituais de comensalidade, o pão é um forte símbolo ritual visto que ele é uma marca cristã. O pão, alimento de Deus, também identifica Santo Antônio, porque os pães alimentam o corpo e o espírito.

Nas festas de rua, nos arrarais, come-se muita sardinha assada na grelha, porque junho é época da boa sardinha que derrama suas gorduras sobre os pães, e recebem ainda generosos banhos de azeite de oliva e algumas rodelas de cebola, que assim fazem o melhor acepipe. E tudo acompanhado de vinho tinto, cerveja e outras bebidas.

Museu do Açúcar e Doce

Foto de Jorge Sabino

Com certeza, comer a festa é um ato de viver a fé, que traz o mesmo desejo de louvar e marcar as devoções pessoais e familiares.

Recentemente, da mesma forma que os manjericos identificam Santo Antônio, a doçaria de Lisboa interpretou os vasos com manjerico verde e cheiroso e a bandeirinha de papel com versos por meio de bolinhos que lembram essas mesmas imagens do verde e fresco manjerico.

Bolinhos, “caques” feitos de farinha de trigo, ovos, açúcar, fermento e laranja, que assim representam a base do vaso, e em cima, imitando as folhas, nata com corante culinário.

Assim, algumas vitrines das padarias e das confeitarias de Lisboa, na época das festas de junho, oferecem os manjericos na forma de doce para serem comidos, apreciados, numa nova maneira de louvar este santo tão popular e querido em Lisboa e em muitos outros lugares.

Raul Lody

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